CAMINHOS DE TRANSFORMAÇÃO: REINVENÇÃO E VISÃO NO EMPREENDEDORISMO

Resumo abrangente do episódio

Origens do Rock in Rio:

Maria Alice Medina discute a origem do Rock in Rio, um festival que se tornou um ícone cultural ao longo de 40 anos. Ela destaca o contexto político e social do Brasil na época, bem como a influência de seu ex-marido Roberto Medina na concepção do evento.

Desafios e Estratégias Iniciais:

Ela relata os desafios iniciais de convencer artistas internacionais a participar do primeiro Rock in Rio e as estratégias criativas que utilizaram para superar o ceticismo e atrair grandes nomes, resultando na confirmação do Queen como a primeira banda a confirmar.

Crescimento e Evolução do Festival:

Medina discute como o Rock in Rio cresceu de um evento com 45 bandas para um fenômeno global com múltiplos palcos e centenas de atos, mantendo-se adaptável às mudanças no mundo do entretenimento e fiel ao seu propósito original.

Pilares do Sucesso do Rock in Rio:

Ela destaca a importância de profissionalismo, foco e propósito no sucesso contínuo do festival, mencionando também a confiança e segurança que o evento oferece ao público, independentemente de sua localização.

Experiência Pessoal e Lições do Caminho de Santiago:

Medina compartilha sua experiência pessoal no Caminho de Santiago, descrevendo-o como um percurso de autoconhecimento e transformação, e como essa jornada pode oferecer insights valiosos para empreendedores em busca de equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Integração de Lições de Vida no Mundo dos Negócios:

Ela discute como as lições aprendidas no Caminho de Santiago podem ser integradas no mundo dos negócios, promovendo uma visão mais humana, simplificada e conectada, essencial para qualquer empreendedor.

Mudanças na Percepção do Caminho ao Longo dos Séculos:

Medina reflete sobre como a percepção e o propósito do Caminho de Santiago mudaram desde sua concepção na Idade Média até os tempos modernos, transformando-se de uma rota estritamente religiosa para um caminho de descoberta pessoal e espiritual.

Preservação do Propósito do Caminho e Desafios Modernos:

Finalmente, ela aborda os desafios modernos enfrentados pelo Caminho de Santiago, incluindo o aumento do turismo e as mudanças físicas no caminho, destacando a importância de manter o propósito original do caminho e o valor da experiência peregrina autêntica​​.

Descrição completa do episódio

Sonhadores e fazedores, bem-vindos ao Podbrand, podcast sobre design, estratégia e inovação.

 

Sou Maurício Medeiros, mentor, consultor criativo em design estratégico e autor do livro Árvore da Marca, Simplificando o Branding.

 

Hoje encerra 2023 com maestria, e que transita entre o contemporâneo e o histórico, abraçando temas de espiritualidade e empreendedorismo.

 

Vamos explorar a origem e a evolução do Caminho de Santiago, uma rota de peregrinação que, desde suas raízes na tradição medieval, se transformou, ao longo dos séculos, em um percurso de autoconhecimento e transformação pessoal.

 

Nossa convidada de hoje, Maria Alice Martina, fez parte também do grupo que colocou o Brasil no cenário mundial do showbiz.

 

Ela é uma testemunha ímpar da criação do Rock in Rio, e autora do livro Do Rock a Compostela, onde relata suas experiências de duas décadas percorrendo o Caminho de Santiago.

 

Com uma jornada que vai desde sua participação na origem do maior festival de música do mundo, até suas peregrinações introspectivas, Maria Alice oferece um olhar único sobre a interseção entre o mundo empresarial e a jornada espiritual.

 

Ao longo deste episódio, vamos mapear como as experiências da Maria Alice no Rock in Rio e no Caminho de Santiago se entrelaçam, oferecendo lições valiosas sobre resiliência, reinvenção e a busca pela harmonia entre mente e espírito.

 

Maria Alice, seja muito bem-vinda.

 

Obrigada Maurício, que bom que a gente tem esse veículo para se conectar, eu em Lisboa, você na Tailândia, e parece que a gente tá tão pertinho, com o mesmo propósito.

 

Agradeço imenso, que bom que a gente pode falar do que é a minha paixão.

 

Fico muito feliz de você ter tocado nesse tema e me provocar nessa direção, é ótimo, que bom.

 

Que bom, fico muito feliz.

 

Eu é que agradeço a aceitação do convite, uma alegria te ter hoje no Podbrand.

 

Este é o nosso episódio que encerra 2023, a nossa segunda temporada.

 

Entrando no tema, Maria Alice, você fez parte da origem do Rock in Rio, maior festival de experiências da música do mundo e traz uma perspectiva única sobre os pilares de sucesso deste evento, digamos monumental.

 

Ao longo das décadas, o Rock in Rio não apenas se consolidou como um ícone cultural, mas também se adaptou e evoluiu, enfrentando as mudanças no cenário global da música e do entretenimento.

 

A história do festival é uma lição em inovação, resiliência e paixão, elementos essenciais para qualquer empreendimento bem-sucedido.

 

Então eu te pergunto, como foi a experiência de convencer os grandes nomes da música do mundo a se apresentar no primeiro Rock in Rio, creio que 40 anos atrás?

 

E em sua visão, quais são os pilares que estabeleceram o Rock in Rio como o maior festival de música do mundo ao longo das décadas?

 

Maurício, como você acabou de dizer, o Rock in Rio tem 40 anos e como qualquer vida é construída, a gente não nasce pronto.

 

Então eu vou tentar juntar um pouquinho de tudo, senão a história vai ser muito longa.

 

Então eu era casada com o Roberto Medina, que é o pai dos meus filhos, e a gente estava num momento de transição no Brasil, na transição política, onde o empresariado não tinha muita...

 

Não estava fácil de você realizar, havia ali um entremeio entre uma coisa e outra que ninguém sabia bem como é que aquilo ia acontecer, como é que estava e como é que poderia ficar.

 

E o Roberto é filho de uma família tradicionalmente fazedora de coisas.

 

O meu sogro amado, Abraham Medina, foi um grande benemérito da cidade do Rio de Janeiro, numa época em que a política interferia muito menos no empresariado.

 

Então ele, por exemplo, coisa rápida, quando se fez o Aterro do Flamengo, com os jardins do Burle Max, ele mandava regar com uma pipa e depois avisava para o governador que ele tinha mandado regar.

 

Ele fazia as maiores paradas de Natal, como a gente hoje conhece da Disney.

 

Não era naquela magnitude, claro, mas eram que atravessava a cidade, iluminava árvores, iluminava os postes.

 

Aquilo era um fascínio, e o Abraham Medina, me lembro dele como empresário, até que conheci o Roberto já adulto.

 

Então o Roberto cresceu nessa família que pensa na sociedade, pensa como é que participa na sociedade, pensa como é que dá alegria ao outro e, naturalmente, no sangue.

 

Ele sempre foi uma pessoa muito criativa e ele queria fazer coisas.

 

A gente já tinha trazido o Sinatra para cantar no Maracanã, em 1980, depois a gente levou para o Rio Barry White, levamos o Bot Bacra, o Julio Iglesias já tinha ido ao Brasil não sei quantas vezes.

 

Quando foi conosco foi aí que apareceu todo o noticiário aqui em cima dele.

 

Ele ia até a praia, imagina, antes de a gente se conhecer.

 

Então a gente já tinha feito coisas muito importantes.

 

Mas havia ali então esse entremeio entre o empresariado e a vontade política ou era tudo muito, aliás, como agora está de novo o Brasil, é vermelho ou preto, preto ou vermelho, é verde ou vermelho, é lado direito ou lado esquerdo, não tem um meio.

 

A gente estava naquele momento em que não tinha ainda o meio e ele não estava conseguindo fazer as coisas que ele queria, projetos novos, mas sempre ele é muito criativo, muito inovador.

 

E numa conversa, eu sempre quis morar fora, isso eu preciso declarar aqui.

 

Meus filhos eram pequenos, Roberta que vive cá, hoje é a presidente do Rock in Rio Brasil e Europa, naquela altura ela tinha cinco anos de idade.

 

E eu dizia para ele, vamos embora, está aborrecido, está assim, vamos embora.

 

As crianças são pequenas, a adaptação vai ser mais fácil.

 

E não, mas o meu país, a minha cidade, aquele patriotismo que ele, aliás, é isso, porque ele mora lá até hoje.

 

E aí o que aconteceu foi que numa conversa mais acirrada, eu disse para ele, olha, não pode fazer pela cidade, faz pelo país e vamos embora sem culpa.

 

E fui dormir, deixei ele zangado lá, porque ele é unino, não gosta de ser enfrentado, claro.

 

E aí ele levou-se um puxão e eu fui dormir e de vez em quando eu olhava assim lá de cima da casa para a sala, ele estava lá no sofá pensando.

 

De manhã cedo, quando ele me chamou e disse, olha, já sei o que nós vamos fazer.

 

Eu disse, está bem, era tudo no plural.

 

Então, está bem, o que nós vamos fazer?

 

Naquela altura a gente já tinha quase 20 anos de casada, uns 15 por aí.

 

Ele disse, vamos fazer o maior festival de música do mundo.

 

Ah, está bem.

 

Então, como é que faz isso?

 

Ah, não sei.

 

Agora a gente tem que começar a pensar.

 

E aí o que nós fizemos?

 

Fomos para as rádios, quem é que canta o quê, quem é que interessa, quem é que pode ser, dar valor.

 

Aí fomos para a televisão, que era a época do Mark ainda, Bonnie, Joe Wallach, aquela turma das antigas.

 

Então, querem participar?

 

Vocês poderiam transmitir?

 

Está bem.

 

Então, o que a TV Globo acha?

 

Que dá ibope.

 

O que a TV Globo acha?

 

Quem é que a gente...

 

Atrás de quem a gente tem que ir?

 

Assim foi.

 

Naquela altura a gente já tinha se aproximado muito do Sérgio Mendes, que já vivia na Califórnia há muitos anos, que foi uma pessoa de atividade também, para a gente se aproximar da equipe do Sinatra.

 

E foi assim que a gente, um mês e pouco depois, a gente estava com uma lista de empresários e artistas e ia bater na porta, dizia, oi, seu Maurício, o senhor representa não sei quem, então, eu sou fulano do Brasil.

 

E era uma gargalhada em cima de gargalhada, porque, naquela altura, eu e ele tínhamos, sei lá, 30 e poucos anos e o pessoal achava que aquilo era nuts, não é?

 

Imagina, dois miúdos aí que não vão fazer coisa nenhuma.

 

E eu tinha levado uma maquete, eu tinha levado perspectivas, a gente abriu um apartamento no Beverly Wilshire, onde a gente estava hospedado, e um apartamento era de escritório e um era para a gente, para moradia.

 

Então, as paredes eram aquelas milhares de desenhos explicando como é que era, como é que era o palco, porque o Roberto também tem um detalhe, o Roberto não trabalha com pouco.

 

Então, a gente conseguiu o terreno emprestado, que aquilo era um projeto que dava pelo menos cinco ou dez anos, naquele primeiro momento, lá no Rio Centro, no terreno particular do Doutor Carlos Carvalho, do Carvalho Rosken, que era amigo da família e que cedeu o terreno que precisava de obra.

 

Então, a gente tinha um investimento importante para colocar aquilo em pé, mas, para você ter ideia, o palco do primeiro Rock in Rio tinha 5 mil metros de área útil.

 

Eram três palcos, porque uma das coisas que o Roberto sempre quis era que aquilo não houvesse atraso, aquela tradicional atraso da noiva, tradicional atraso do show, aquilo não podia acontecer.

 

Então, enquanto alguém se apresentava, dois estavam se preparando, e os palcos andavam brilhos no palco principal.

 

Era uma tecnologia extraordinária.

 

Enfim, nós ficamos um mês em Nova Iorque, escutando não, não, não, não, não.

 

Depois a gente foi para Los Angeles, eram já quase 20 dias de não, não, não, não, não.

 

E o Roberto um dia me disse, a gente estava andando na rua, pensando, pensando, como é que faz, como é que faz, e ele disse, olha, vamos embora, esse negócio não está certo, chega, estou cansado.

 

De novo, eu dei um sacolete e disse, olha, vai acontecer.

 

Pode não acontecer?

 

Na hora que você quer, naqueles dez para as quatro da tarde, numa quarta-feira de sol iluminado, mas vai acontecer.

 

Então, a gente tem que quebrar a cabeça e encontrar o que é para fazer.

 

E a ideia que nós tivemos, que foi a Salvadora, foi falar com o Milton Rudin, que era o attorney do Sinatra, que tinha ficado muito nosso amigo, o Mickey já fez a passagem dele, a mulher dele é a minha irmã americana até hoje, Mary Carol, e eles têm credibilidade, nós não tínhamos.

 

Eles ficaram tão amigos e tão gratos do trabalho que a gente fez para o Sinatra no Maracanã e no hotel, e a gente disse, Mickey, se você convocar uma conferência de imprensa, o povo vem, não vem ninguém, não sabe quem é.

 

E ele concordou, achou que era uma boa ideia, convocou, no dia seguinte tinham lá 20 veículos, e ele disse, eu quero apresentar a vocês, o casal Medina, que fez o maior show da vida do Sinatra, com 160 mil pagantes no Maracanã, nós apresentamos o projeto, no dia seguinte encheu a mídia de notícias, e a primeira pessoa que nos ligou para o hotel dizendo que iria, que já tinha dito não, lá para trás, foi o Jim Beach, que era o empresário do Queen.

 

E na hora que o Jim Beach e o Queen quiseram, eu também, eu também, eu também, eu também, aí fez uma fula.

 

A primeira banda a confirmar foi Queen.

 

Foi o Queen, foi o Queen.

 

Incrível.

 

E o Jim ficou muito amigo nosso, depois veio para o Bar Mitzvah do meu filho, enfim, veio não, foi para o Brasil, lá para a nossa celebridade e tal.

 

E com isso ele abriu um caminho para muitas bandas quererem.

 

Então a gente voltou, 20 dias depois, para o Brasil já.

 

Para você ter ideia, é incomparável, apesar do primeiro ser mágico, aquela altura eram 45 bandas, entre brasileiros e estrangeiros, onde cada um tocava duas vezes.

 

Então, hoje, o último Rock in Rio no Brasil, no ano passado, em 2022, tinha nove palcos.

 

Eu não sei mais quantas bandas são, são minimamente 200 bandas, não sei.

 

E você imagina o que é a logística de administrar, não é?

 

É claro que já aconteceram adaptações, hoje em dia é o artista que paga pelo seu hotel e pelas coisas que ele quer de extraordinários.

 

Lá atrás não era assim.

 

O Prince, quando foi para o segundo Rock in Rio, em 1991, ainda que foi no Maracanã, ele levou um jumbo, ele levou 120 convidados.

 

Todos custeados pelo Rock in Rio.

 

Aí você vai dizer que é impossível, mas a gente fazia o impossível.

 

A tua pergunta é de que o Rock in Rio é o maior festival.

 

O Rock in Rio já nasceu com um propósito muito grande, aí a gente quase que volta para o início da tua pergunta.

 

Foi num momento de transição do Brasil, foi num momento de insatisfação do Roberto, que aproveitou a criatividade dele, mas a intenção, o propósito do Rock in Rio, o nascimento do Rock in Rio foi de fazer um movimento onde a gente mostrasse que o Brasil não é Tupiniquim, que o Brasil não tem macaco e cobra andando na rua, que por acaso também não é o Brasil da Argentina.

 

E num propósito de usar a música como elemento de união, o elemento da paz, porque a música é a pátria.

 

Quando todo mundo canta uma música árabe, uma música da Índia, uma música da Bahia, é a música, não são as pessoas.

 

Então o propósito era usar a música como instrumento de paz.

 

E eu acredito que pelo profissionalismo, pelo foco, pelo propósito que nunca foi outro, ele não mudou.

 

Ele pode ter, pode ter não, com certeza tem, mudado a maneira de trabalhar, os aprendizados que vêm de um desafio desse tamanho, as mudanças do mundo, as mudanças técnicas necessárias, adaptativas.

 

Então ele hoje é o maior festival de música do mundo, sim, mas ele nasceu na cabeça, no primeiro propósito, a fazer o maior festival do mundo.

 

Mas ele só se perpetuou pelo profissionalismo e pelo propósito.

 

Não é só porque tem todo mundo que quer ir lá ver.

 

Não é assim?

 

Então a gente teve a alegria de ter naquele primeiro, foram dez dias corridos, quando acabou Rock in Rio, toda diretoria da empresa estava doente, toda, infarto, uma confusão danada.

 

Então ele hoje é sim o maior e ele continua com o seu propósito.

 

Então eu acho que é essa credibilidade que ele adquiriu, seja na segurança, seja no que a gente entrega na proposta e na promessa ao público, que faz toda a diferença.

 

Então, se ele é em Lisboa, todo mundo quer ir.

 

Em 2015, foi feito em Las Vegas, estava lá, o mundo inteiro.

 

Duas edições em Espanha, 2008, 2010, estava lá.

 

Por que não em Lisboa?

 

Porque aí são interesses da empresa.

 

Eu não sou mais da empresa, mas o meu codinome de mãe do rock não é só por ser mãe dos filhos do Roberto.

 

É porque realmente eu estava lá no início, nós éramos quatro pessoas em Los Angeles, quatro, eu, ele e dois diretores.

 

Um diretor que já fez essa imagem também, o Oscar Einstein, que era um senhor brasileiro, alemão, que foi em Relações Fúrias do Copacabana Palace, 20 anos, e que era um gentleman, um verdadeiro embaixador, e que para dois miúdos de 32 anos fazia toda a diferença ter um senhor do lado.

 

Trazia credibilidade.

 

E para saber como se comportar, e algumas coisas que a gente...

 

Algumas bandas com idiomas que a gente falava.

 

Eu falo espanhol e inglês muito bem, mas havia outro pessoal para falar, do alemão, até não entender, ele passava na frente.

 

E a quarta pessoa era o Niemeyer, que era um funcionário nosso muito querido, um amigo até hoje muito querido, que depois saiu da empresa e foi fazer o Hollywood Rock e caminhou a vida dele para o outro lado.

 

Mas éramos quatro, o verdadeiro exército, acreditando que a gente vai fazer o maior festival de música do mundo.

 

Então, por essa vontade, por esse propósito, é que eu acho que ele se mantém e que ele tem o merecido sucesso, porque ele cresceu, ele expandiu, ele não só cresceu, ele se agigantou e, na realidade, é um evento que merece o aplauso, é um evento que merece o reconhecimento do público.

 

O público vai sabendo que tem segurança, o público vai sabendo que engarrafa um pouco, mas não dá problema, vai sair, porque a logística e o refinamento de...

 

Para você ter ideia, só um detalhe, no Rio de Janeiro, que agora ocupa o Parque Olímpico gigante, ali no Rio são 110 mil pessoas por noite, aqui em Lisboa são 85.

 

No Rio, para 110 mil pessoas trabalhando, tem mais ou menos 25, 27 mil pessoas trabalhando por noite.

 

Não são nossos, são dos clientes, são dos sponsors, são os voluntários, são os técnicos, mas é muita gente.

 

Então, aquilo para funcionar, para entrar e para sair, tem todo um cuidado que, na hora que a gente toca a música, quando acabam os jogos e acende a plateia, é para dar segurança, é para dar tranquilidade.

 

Artifícios de cuidado com o nosso público, onde realmente faz a diferença.

 

Então, o conjunto do cuidado e do propósito...

 

Hoje o Rock in Rio tem o ISO, não sei que número, 21, e todo o carbono zero, e a construção de árvores na Amazônia, e todo o trabalho social que a gente faz, salas de música, de estudo supletivo, salas de música nas favelas.

 

Agora, em São Paulo, o The Town fez uma reabilitação de uma favela que ficou um escândalo, aquelas casas cinzas e madeiras, aquilo tudo é construído, parece uma obra do Cobra, sabe?

 

Uma coisa assim, extraordinária.

 

Então, dá autoestima, dá um encantamento de participação.

 

Aqui em Lisboa também, quando a gente chegou no Parque da Bela Vista, o bairro é um bairro social, perto.

 

Já naquela altura, o Rock in Rio está fazendo 20 anos em Portugal, o ano que vem, e já naquela altura foram contratadas pessoas que trabalhavam naquele lugar social para que viessem trabalhar na obra do Rock.

 

Só daí a gente já faz uma integração, uma interação que diminui a distância social.

 

Então, são pequenos detalhes onde a gente tem esse olhar para o outro e eu falo no plural porque eu não consigo me deixar de lembrar que eu sou a mãe do Rock.

 

Eu tenho mesmo muito orgulho, apesar de não trabalhar lá, de não ter ligação com a empresa, mas tenho três filhos que cada um é presidente de um núcleo do grupo da família, então eu tô bem por dentro.

 

E mãe do Rock só tem uma, né?

 

Se fosse bom, todo mundo tinha mais de uma, né?

 

Mãe é um bicho chato pra caramba.

 

Então, é a mãe do Rock sou eu, paciência, sou eu.

 

É uma experiência maravilhosa e o Rock in Rio, pelo teu depoimento, traz até hoje a essência da ideia do primeiro evento, 40 anos atrás.

 

Isso é o que dá sustentação para esse sucesso do maior festival do planeta e que traz o Brasil para o mundo.

 

Um exemplo de organização, de eficiência, de experiência construída, inclusive, para os músicos.

 

Eles devem sentir prazer em ir para lá.

 

E hoje em dia eles quase que, já a gente tem esse valor, eles quase que adequam a agenda para poder estar no Rock.

 

Porque também tem um detalhe, né?

 

O Brasil é muito longe, né?

 

Então, para eles descerem, lá atrás, os cachês eram muito mais altos, porque eles iam para aquela longeura do Brasil que ninguém sabe bem o que é.

 

Hoje em dia, não.

 

Hoje em dia, quando eles...

 

Primeiro, eles têm o interesse de participar da mídia, da público, etc.

 

Faz parte do caminho de cada um.

 

E depois, eles já conseguem fazer shows em outros países da América Latina.

 

Então, eles agendam de um jeito que conseguem fazer um trabalho, uma turnê, por menor que seja, não precisa fazer 10 shows, mas eles dão um jeito de adequar a agenda.

 

Ontem me telefonaram, mas você sabe se o Coldplay vai estar no Rock in Rio ano que vem, no Rio?

 

Aí eu perguntei, vai estar?

 

Não, não vai estar.

 

Não é só porque a gente não quer, é porque talvez ele também não possa, né?

 

Na hora que você quer um artista que está agendado para outra coisa, às vezes a gente não consegue.

 

Não é que não quer agendar.

 

Se a gente tiver a ingerência sob a agenda de todo mundo, é diferente.

 

A sua jornada no caminho de Santiago, e que detalha em seu livro, reflete uma busca profunda por equilíbrio entre mente e espírito.

 

Este caminho histórico percorrido por milhões ao longo dos séculos oferece mais que uma experiência religiosa, é um percurso de autoconhecimento e reflexão.

 

E em seu caso, integrando lições do caminho no mundo dos negócios, oferecem sites valiosos para empreendedores que buscam harmonia em suas vidas profissionais e pessoais.

 

Então, com base na sua experiência no caminho de Santiago, como você acredita que essa jornada pode contribuir para a harmonia entre mente e espírito de um empreendedor?

 

E quais lições específicas do caminho podem ser aplicadas no mundo dos negócios?

 

Olha, o tema do caminho, eu acho que hoje em dia já é mais apaixonante do que o rock para mim.

 

Então, o caminho surgiu em mim também no momento de transição, e eu fiz uma escolha.

 

Eu escolhi sair do mundo em que eu vivia para buscar o que era mais parecido comigo.

 

Na verdade, Maurício, o caminho não começa quando você pisa o caminho, em Espanha, em Portugal, na França.

 

O caminho começa num apelo que sai do seu coração.

 

Ele não começa nem na porta da sua casa, nem depois de um voo.

 

Ele começa dentro de você.

 

Eu levei 10 anos para chegar no caminho a primeira vez e o caminhar, o caminho hoje em dia, se a gente só falar no caminho, parece que é um produto, como se as pessoas fossem visitar o Coliseu de Roma.

 

Eu nunca fui lá, eu quero ir.

 

Não.

 

O caminho é um processo.

 

O caminho é o caminhar, o estar no lugar onde as pessoas vão para ter a experiência do caminhar longas distâncias, vários dias.

 

Ele leva para um lugar de silêncio interior que é muito difícil ou quase impossível, por mais meditativa que a pessoa seja, por mais yoga que ela faça, por mais meditações diárias.

 

Na selva da cidade ele é quase impossível.

 

Então, se você observar as danças ritualísticas de várias religiões, várias nações, várias culturas, a maioria delas é feita com batimentos de pés.

 

Os pés se alternam, cada um no seu ritmo, cada um no seu desafio.

 

A gente vê no Instagram agora os africanos dançando de uma forma que você não sabe como é que a criatura sai andando depois dali, mas é genial.

 

Então, esse bater de pés no seu ritmo, diariamente, durante um longo período de horas, faz sim uma abertura, um trabalho energético nos seus centros energéticos, acreditem ou não.

 

Não precisa ser nem católico, nem budista, nem espírita, ou o que seja, para acreditar.

 

Isso é o que acontece no nosso corpo, que levam a gente a um estado de consciência que não é fantasmagórico, não é milagroso, não é para você encontrar a Virgem Maria sentada numa pedra te esperando, não é isso.

 

Mas o teu estado interno se transforma.

 

Por isso é que eu não aconselho as pessoas a fazer essa caminhada, seja em que país for, em três, quatro dias, porque não dá tempo de você deixar um pouco a bagagem da selva, da propriedade, para se entregar àquele ambiente.

 

No momento em que você se permite, claro que para um empreendedor ativo não é fácil ter os 30 dias, 30 e poucos, para fazer o caminho mais longo, que é o caminho que sai de Saint-Jean-Pied-de-Port, na França, que é a última cidade na fronteira com a Espanha, ou pode sair de Roncesvalles, que é a última cidade na Espanha, na fronteira com a França.

 

Ali o grande desafio é que no meio tem os Pirineus, e os Pirineus são 25, 27 quilômetros de subida no primeiro dia.

 

Então muita gente quer passar lá, porque é belíssimo, belíssimo, mas é um grande desafio.

 

Por exemplo, você não pode sair de Saint-Jean-Pied-de-Port sem ter absoluta certeza do clima daquele dia lá em cima.

 

É 1.400, 1.500 e poucos metros, mas lá em cima tem vento de às vezes 90 quilômetros por hora, não tem uma tenda, não tem uma árvore para você se agarrar, não tem para você sentar.

 

Você vai passar por cavalos, por ovelhas, por vacas, por grama, por arados, mas é seguir.

 

Quem não tem, ou melhor, quem tem dúvida dos próprios joelhos, melhor sair de Roncesvalles, que já começa a descer, porque só você tem 30 dias de problema de joelho.

 

Então, o empresário consegue estar lá por esse prazo, ou está fazendo um sabático, ou quer fazer o caminho e vai para uma reunião depois em algum lugar, ou saiu de uma reunião, não sei aonde, e quer estar no caminho, mas qualquer coisa, como 15 dias no caminho, os próprios 10 dias que a gente faz do porto para o porto, já são transformadores.

 

A única premissa que eu insisto em perguntar, aqui em Portugal eu trabalho como consultora para o caminho também, eu sou embaixadora de diversos segmentos, mas uma das coisas que eu gosto de fazer é a consultoria para o caminho.

 

E eu pergunto, você quer ir para Portugal por quê?

 

Porque eu soube que a Espanha é linda, a comida é ótima, o vinho, então eu acho que eu queria te dar uma sugestão, vai para Bilbao, que tem um museu lindo, vai a Granada, que é toda vermelha, visita Toledo, que é incrível, mas não vai para o caminho, o caminho não é político.

 

Também o caminho não tem aquela regra que você tem que, tem que, não tem que nada.

 

A única coisa que vale chamar a atenção é você se entregar ao caminho, e se entregar ao caminho quer dizer, você realmente ir com uma bagagem leve, é realmente você se desapegar das máscaras que a gente é obrigado a usar na cidade grande, nos padrões pré-concebidos para você se aceita em determinado segmento.

 

Quem não se entrega ao caminho, meu querido, não aguenta.

 

E não aguenta não é porque são 18, 20, cada um faz o que quer.

 

O caminho francês então, que atravessa a Espanha, pela Navarra, Rioja, Cacilha, o caminho, ele não se chama, só um break, ele não se chama francês porque é da França, ele se chama francês porque foi por onde Napoleão invadiu a Espanha.

 

Primeira explicação.

 

Então, ali, ou qualquer outro, qualquer um dos portugueses, dentro da Espanha tem um monte de caminho, mas quem vai para uma caminhada dessa e não se entrega dormindo uma noite em cada cama, uma noite com cada travesseiro, quando tem travesseiro, já é uma coisa boa também, comendo uma comida que não é a sua, tomando um banho que não é no seu banheiro, no quinto dia não aguenta, porque tem que lidar com as dores do corpo, tem que lidar com adaptabilidade, tem que lidar com a aceitação, são coisas desafiantes.

 

Então, eu acredito que o empreendedor é a pessoa que realmente empreende pela sociedade.

 

Todos, todos deveriam fazer o caminho, deveriam se permitir esse desapego, essa simplicidade, essa nova maneira de abrir os sentidos, de clarificar sua mente, se permitindo não levar o headphone, não usar o celular, aguentar a ansiedade de saber as notícias, aguentar a ansiedade de dar notícias, aguentar a ansiedade de publicar, estou cá, comi isso, comi aquilo, porque na hora que você se permite estar naquele lugar, nem sempre é só silêncio, alguns trechos têm muito movimento, tem muitos grupos hoje em dia, infelizmente, tem pessoas que gostam de andar cantando, tem pessoas que gostam de andar brincando.

 

Eu, como eu vou sempre sozinha, quando eu quero, e eu gosto de gente, para conversar e para aglutinar é muito fácil, quando eu quero ficar sozinha eu aviso, olha, amanhã eu vou sair mais cedo, ou eu vou deixar vocês irem, vou atrás, a gente se encontra pelo caminho, já comi, já estive andando uma vez com uma senhora que quando chegou a Sarria, que são os 115 a Compostela, ela disse, olha, eu quero te avisar que a partir de agora eu só falo em Compostela, tá bem, não, eu me prometi que os últimos 100 quilômetros eu vou andar ao terço todos os dias por todos os meus amigos, ok, eu não sou religiosa, eu não vou pela pela religião, me fascina a história, me fascina a quantidade de informação cultural que a gente recebe no caminho, os lugares fantásticos que a gente passa, mas eu sou espírita, eu vou pela religião e o caminho nunca vai ser a mesma coisa para você do que é para mim, nem nunca, eu tenho 14 chegadas a pé a Compostela, nenhuma foi igual a outra, eu já cheguei para Portugal, já cheguei para o ano passado, eu saí de Salamanca fazendo o caminho de Torres, que encontra o caminho de Santiago, é um caminho medieval, não é caminho de Santiago, mas é o caminho 1700, não sei quanto, mas chega, encontra o caminho que leva a Valência do Minho, pega o caminho central para Compostela.

 

Então, eu acredito nisso, você me perguntou do empreendedor, eu não quero me perder muito, eu acredito que na hora que a pessoa vai para o caminho, com seus próprios motivos, com seus próprios desafios, com as suas próprias capacidades físicas, emocionais e fisiológicas e de saúde, não existe uma regra, você não tem que andar seis quilômetros em uma hora, você não tem que fazer 30 quilômetros por dia, você não tem que nada, agora estar lá e não ouvir o passarinho e não escutar a buzina do carro para não ser atropelado, como acontece, não escutar o cachorro latir, não parar para escutar o rio cantar, é um desperdício.

 

Então, se você se entrega ao caminho, o caminho é tão revelador, na realidade, é um silêncio que permite a sua conversa do eu para mim, que é diferente do eu para mim, o mim sou eu lá dentro, só eu que escuto e o eu sou o ser que eu estou conversando com você.

 

Na hora que eu quero conversar comigo, é do eu para mim e nem sempre é fácil, a gente tem mais ou menos como informação, por exemplo, a pessoa na primeira semana, nos primeiros cinco dias, você lida com as dores do corpo, você se adequa, você se adapta, você briga com você mesmo, que raios eu tô fazendo aqui, cansado desse jeito, suado desse jeito, carregando peso, que ideia de doido que foi essa?

 

Você vai, os pés, não adianta você ter uma Ferrari, basta um pneu não estar cheio, aquilo não anda.

 

Então, seus pneus são seus pés, são seus joelhos, tem que ter ritual do pé, tem que cuidar do pé de noite, tem que cuidar do pé de manhã, tem que amarrar a bota de determinada maneira, para o pé não ficar solto lá dentro, senão vai fazer bolha, fazendo bolha vai sofrer, não precisa.

 

Eu não conheço uma bolha, Maurício, em todos esses meus caminhos, não conheço, já tratei bolha de muita gente, sei como é que trata a bolha de peregrino, mas eu não conheço a bolha, porque além do que, eu escolho onde pisar.

 

Isso também é uma ideia que serve para o nosso empreendedor, escolhe, preste atenção, respeita, respeita, humildade, o caminho ensina um acolhimento, um compartilhamento de necessidades.

 

Se alguém te ver com uma dor de cabeça, passa alguém que você nunca viu na vida, que nem fala a tua língua, oferece um comprimido.

 

Se você estiver sozinho, tiver alguém comendo perto, oferece uma comida.

 

Então, para o empreendedor, eu acho que abre a visão do outro, a visão do simples, a visão de que somos todos iguais, a visão de que o meu incômodo é seu também, a sua dor pode ser a minha dor amanhã, seja a dor física, a dor emocional, o desafio pessoal, quantas histórias, quantas histórias existem lá.

 

Então, nesses primeiros dias, a pessoa briga com o próprio corpo, depois ela começa a desfrutar, começa então a dizer, agora já estou sabendo como é que está, já sei como é que é mesmo, né?

 

E aí ela começa a viver o caminho, ela esquece as chatices e começa a viver o caminho, a usufruir.

 

E já quando ela está chegando a Santiago, é muito comum as pessoas, 80, 60 quilômetros antes, começam a andar mais devagar e ninguém quer chegar.

 

E aí você já está pensando, o que eu vou fazer com isso?

 

Como é que eu volto para aquela vida?

 

Como é que eu vou encontrar aquelas pessoas?

 

Porque você tem insights, você tem memórias, você tem descobertas, não é para chegar e jogar o armário todo fora, separar da mulher, não é isso, mas você volta diferente, quando você se permite fazer um caminhar que não precisa ser solitário, não precisa ser silencioso, mas você se permite estar no caminho, uma vida da simplicidade, uma vida onde o peregrino, a gente costuma dizer que o turista pede e o peregrino agradece.

 

O peregrino só quer uma cama pequenininha, não quer mais nada.

 

O que o peregrino tem que fazer?

 

Andar, comer, lavar roupa, descansar, dormir.

 

Andar, comer, lavar roupa, descansar, dormir.

 

Não tem o que fazer.

 

E esse olhar para si com essa frequência maior faz uma conexão que aqui no dia-a-dia quem consegue?

 

Com tanta tecnologia, com tantas respostas necessárias, você tem que responder um zap rápido, senão não fica gentil, você tem que dizer onde é que você está, você tem que organizar, lá não tem que nada.

 

Eu acredito muito e recomendo até que possam fazer essa experiência de entrega, porque com certeza faz toda, toda a diferença no olhar para a vida.

 

Isso é importante para um empreendedor, seja ele do tamanho que for.

 

Depois tu confirma se a minha narrativa vai estar correta, tu tens um livro escrito sobre o tema, para contextualizar para as pessoas que não conhecem, O Caminho de Santiago, do Róquia Compostela.

 

Maravilhoso.

 

Mas eu gosto muito do subtítulo dele, que diz, às vezes se ganha, às vezes se aprende.

 

Excelente.

 

É um livro de fotos, mas tem textos, tem parte histórica, em espanhol e brasileiro.

 

Agora estou preparado para fazer o e-book em três idiomas.

 

Excelente.

 

O Caminho de Santiago, ele também, historicamente conhecido como Peregrinatio Compostelana, em latim, ele é uma rede de rotas de peregrinação que conduzem à Catedral de Santiago de Compostela, na Galícia, noroeste da Espanha, onde a tradição afirma que os restos do apóstolo Tiago estão enterrados.

 

A origem deste caminho, ela remonta ao início do século IX, com a descoberta dos restos mortais de São Tiago, o maior.

 

Desde então, tornou-se uma das principais rotas de peregrinação do cristianismo medieval, que durante a Idade Média, o caminho era uma rota na qual se podia ganhar uma indulgência plenária.

 

E hoje se transformou nessa passagem, eu diria que um rito de passagem, do encontro da própria vida, com raízes que remontam à Idade Média, tem-se visto uma mudança significativa na percepção e no propósito ao longo dos séculos.

 

De uma rota estritamente religiosa, transformou-se em um caminho de descoberta pessoal e espiritual, o exemplo que tu trouxeste, atraindo pessoas de diversas origens e crenças.

 

Esta evolução histórica do caminho espelha as mudanças na sociedade e motivações individuais de cada peregrino.

 

Então, eu te pergunto, considerando as origens do caminho de São Tiago no contexto medieval e a evolução da sua importância ao longo dos séculos, como você acha que a percepção e o propósito do caminho mudaram desde a sua concepção até hoje?

 

Eu acredito que o propósito do caminho é o mesmo.

 

E como você disse, quem começou, quem teve as primeiras autorizações para caminhar a Compostela, para honrar o santo, eram os presidiários, onde eles caminhavam como indultos de pena.

 

E eles tinham que chegar à Compostela, bater a cabeça para o santo e andar mais 90 km a Finisterre.

 

Era uma época em que a terra era quadrada, então acabou a terra, só tem água, aqui é o fim da terra.

 

Fim da terra, fica no Atlântico, não é?

 

É, fim da terra, Finisterre.

 

E lá é ainda hoje uma região pesqueira.

 

E lá havia, só lá, uma concha, que é o que a gente conhece como Coquim Sanjac, que é uma concha côncava, tem uma tampinha em cima, e essa parte côncava, que é a concha peregrina, eles tinham que levar de volta e dizer, é de lá, como prova.

 

E na volta eles usavam para pegar água no rio, para comer, e ao longo dos séculos a concha foi se tornando símbolo peregrino, por isso é que o peregrino anda com a concha, à vista, na mochila, pendurada no peito, em qualquer lugar, para mostrar que peregrino não é mochileiro, essa é a primeira coisa.

 

O caminho que começou como penitência, muito rapidamente se transformou em devoção.

 

Ele é um dos cinco países de peregrinação religiosa do mundo, Meca, Jerusalém, Roma, Santiago, Compostela, e eu acredito piamente que o caminho, o propósito dele nunca mudou, o que vem mudando, e eu acabei de chegar de um congresso internacional em Compostela, onde a grande preocupação é exatamente essa mudança de quem está no caminho, de quem vai para lá.

 

Porque, há anos atrás, os brasileiros eram a segunda maior população internacional a estar no caminho, graças ao meu querido amigo Paulo Coelho.

 

Hoje em dia, não, nós já estamos na décima primeira colocação em número, estão lá os holandeses, os franceses, os ingleses, os espanhóis, mas as pessoas descobriram que o caminho é um turismo barato.

 

E aí, aquilo que eu te falei um pouco antes, de que a pessoa quer ir para fazer turismo, eu aconselho que realmente vá fazer turismo, mas não é no caminho, é em outro lugar, é Espanha, mas é um pouquinho mais fora daquela trilha lá.

 

Então, o propósito do caminho de introspecção, de observação, de foco, de propósito de chegada a Compostela, eu acho que ele está mantido.

 

O que vem mudando são duas coisas importantes.

 

Uma é isso do turismo barato, onde as pessoas acham que, ah, eu vou, caminho um pouquinho, depois eu pego um carro, caminho mais um pouquinho, não vira outra coisa.

 

A segunda coisa que mudou foi que, de uns anos para cá, 2016, 2017, começou a haver, no caminho, um serviço que leva a sua mochila para onde você resolveu dormir.

 

Então, você deixa um tag, vem um carrinho, pega aquilo e leva.

 

Com isso, as pessoas, como se diz no Brasil, deitaram-se na rede.

 

Então, ninguém mais quer carregar peso.

 

Só que aí passou para o futuro, que as pessoas vão de mala de cabine de avião e levam uma mochilinha para passar o dia a pé, qualquer coisa, água, capa, comidinha, não sei o quê.

 

E as malinhas, às vezes mais de uma, para depois fazer uma outra coisa, depois eu vou também para não sei onde, vou visitar uma neta, um apartamento, não sei.

 

O que que isso está acarretando?

 

Está acarretando um povo que vai para o caminho, que não tem nada de peregrinação, que, pelas companhias de turismo, que reservam os lugares para as pessoas dormirem, o peregrino que está caminhando chega, não tem onde ficar.

 

Por outro lado, as carrinhas dos senhorinhos que resolveram, às vezes nem mais senhorinhos, um garoto que está nas férias ou que está fazendo um part-time para qualquer coisa, pega lá a carrinha do pai e transporta as mochilas.

 

Só que é muito diferente transportar uma mochila do que transportar uma mala de cabine.

 

A mochila, com grandes excessos que se vê, algumas chegam a 15 quilos, que é uma aberração, às vezes tem mais do que 15 quilos em uma malinha.

 

Então, essas carrinhas que supostamente começaram para ajudar o peregrino, e claro que era para ajudar os peregrinos mais velhos, que queriam caminhar, mas que sofrem mais em carregar o próprio peso da mochila, essas carrinhas estão tendo que ser substituídas, porque carregar malinha é diferente da mochila.

 

Então, isso está interferindo até no comércio, dentro dos carros da história.

 

E a outra coisa é que os autarcas, que a grande maioria não é peregrina, é só político, é ajudar o peregrino a caminhar, na compreensão deles.

 

Então, o que eles estão fazendo em alguns casos?

 

Tem muita pedra, ele vai lá e bota um cimento, vira uma escada.

 

Tem muita lama, ele bota brita, às vezes a brita solta e às vezes a brita com cimento.

 

A brita acaba com o pé da gente, acaba, não há bota que sobreviva de pé, andar um dia inteiro em cima de brita.

 

E tem trechos de sete quilômetros que você não tem o que fazer, você tem que andar ao lado de uma carreteira, e a carreteira em Espanha, Portugal menos, mas em Espanha é muito perigosa, porque o acostamento na Espanha tem um metro de largura e a velocidade é altíssima.

 

Então, acontece de tudo.

 

Eu mesma, no primeiro caminho, vim andando um dia de chuva com aquela capa, que a gente chama chapa, capa de pedra, que cobre o corpo todo e cobre a mochila também, que você fica igual a um monstrinho.

 

Eu vim andando e do mesmo jeito, que tem muita gente que gosta de ajudar o peregrino e aprecia a peregrinação, tem muita gente que não gosta, que acha que é um bando de gente que não tem o que fazer, foi pra lá andar, com certeza é a toa na vida.

 

Então, você recebe aplausos, às vezes até milioneiros, muito bem, e recebe também outros gestos que não interessam, porque o cara vai dizer o que você está fazendo aqui, volta pra tua casa, não precisa estar aqui atrapalhando ninguém.

 

Com isso, alguns caminhões passam muito perto demais, numa velocidade altíssima.

 

Eu vinha caminhando um dia de chuva com essa capa, ele passou tão perto de mim, ele fez um vácuo embaixo da capa, me tirou de cima, com mochila e tudo.

 

Eu só não caí porque tinha um guard rail do meu lado, porque era um precipício.

 

Então, até pra isso, a gente tem que ter atenção na caminhada, no caminho, porque algumas vezes, o caminho, a seta, você tem que seguir a seta amarela, que foi uma coisa marcada por Elias Valinho nos anos 80, que era o paro da cidade do Sebreiro, e resolveu fazer marcas para ajudar o caminhão.

 

As setas azuis levam a Fátima e as setas amarelas levam a Compostela.

 

Eu tenho a minha setinha aqui, dá pra você ver?

 

Se você anda dois, três quilômetros e não vê seta nenhuma, volta porque não tem sentido.

 

Precisa seguir a seta para chegar.

 

Com isso, as pessoas vão para o caminho seguindo as setas, brincando, sem peso, leves, sorridentes, e com os autarcas fazendo essas mudanças físicas no caminho, facilitando a passagem dos carros para levar as mochilas.

 

Então, o propósito do caminho é o mesmo, a maneira do caminhar é que está sendo diferente.

 

Então, eu abstraio essas modernidades e sempre vou para o caminho com o mesmo propósito, que é o silêncio, que é a simplicidade, que é a entrega, que é o estar sem máscaras, sem preconceitos, sem padrões necessários, mais válidos ou menos importantes.

 

Onde você interage com pessoas do mundo inteiro, onde você ajuda pessoas do mundo inteiro.

 

Eu viajando, como fisioterapeuta, eu trato o pescoço, eu trato o joelho, eu paro, eu vejo uma mochila muito torta, eu peço desculpa, posso arrumar sua mochila melhor?

 

Porque você vai acabar caindo amanhã, tá todo torto, né?

 

Então, eu acho que o propósito do caminho permanece.

 

A maneira de dormir nele é que vem mudando.

 

Então, as pessoas dizem, ah, mas você fica em albergue, nossa, mas dormir com 20 pessoas é um imenso exercício, imenso exercício de aceitação, de humildade, de simplicidade, de respeito.

 

O albergue, no máximo às 10 horas da noite, tá tudo pagado e você não faz barulho pra não incomodar o outro.

 

Você quando vai, levanta de manhã, de madrugada, pra ir à casa de banho, banheiro, você não faz barulho, porque você não quer disturbar quem tá dormindo.

 

Se você tem, eu já falei antes, se você tem qualquer intercorrência, qualquer problema, passa alguém pra te ajudar.

 

O peregrino se ajuda, o turista, turismo nem sempre.

 

Ele te ignora um pouco, né?

 

É tão igual, é tão leve, é tão solto que às vezes nem cumprimenta.

 

O peregrino não passa por peregrino sem desejar um bom caminho.

 

Sempre um bom caminho, bom caminho, bom caminho.

 

Ontem, só pra ilustrar isso, ontem eu fiz um encontro peregrino aqui em Lisboa, num bar-restaurante de uns amigos que decoraram o bar como uma sala de uma casa.

 

Sofás, poltronas, mesinhas, umas diferentes e tal.

 

Chama-se sala de estar, o lugar.

 

E eu convidei só peregrinos.

 

E um amigo meu peregrino que andou comigo esse caminho, que chegou a Lisboa, não conseguiu mais ir embora, não conseguiu voltar para o Brasil até hoje, está aqui e já vai voltar de novo.

 

Ele é o curador desse lugar.

 

Então a gente combinou fazer um encontro peregrino.

 

Ali tinha, ontem, umas quase 40 pessoas, onde tinha um empresário de muitas, muitas, muitas facetas e grandes.

 

Tinha gente que não tem emprego, que está precisando de ajuda.

 

Tinha pessoas de 70 anos, quase 80.

 

Tinha gente com 20 e poucos.

 

Tinha gente com 30, 40.

 

E eu não quis fazer o encontro para eu falar.

 

Então eu acolhi todo mundo e disse olha, nós estamos aqui para falar do caminho.

 

Quem vai começar?

 

E aí um amigo nosso, que é músico, que já fez vários caminhos portugueses, o espanhol, já saiu de Lisboa a pé, é brasileiro, veio aqui com a família e tal.

 

Começou a dar o depoimento dele e disse que agora que já fez os quatro ou cinco, quando ele vai saindo muito do eixo, a mulher diz assim, onde é que você quer caminhar?

 

Vai andar um pouco, que você volta melhor.

 

Então ele pega um break de uma semana na empresa e escolhe o que vai fazer.

 

Se tiver mais tempo, se tiver um feriado, ele aproveita e vai lá, que a mulher mesmo agora que...

 

Incentiva.

 

Incentiva, porque aquilo faz um bem e ele volta mais tranquilo.

 

Então cada um com seu depoimento.

 

Aconteceram momentos de muita gargalhada, porque tem as coisas engraçadas que acontecem no caminho.

 

Aconteceram momentos de emoção, quando a gente viu todo mundo de olho mais molhadinho, porque alguém estava falando uma coisa mais profunda, uma situação mais delicada.

 

Então o caminho é absolutamente múltiplo.

 

Hoje eu estou recebendo um monte de agradecimentos da gente ter feito um encontro para falar do caminho.

 

Porque, aliás, uma das coisas que um dos empresários falou é que quando ele voltou, ele...

 

Aconteceu dele...

 

Ele não tinha intenção, mas aconteceu dele acabar selecionando um pouco as amizades, porque ele chegava em alguns grupos, fosse de trabalho ou na família, e começava a querer contar a experiência dele, falar do caminho.

 

E as pessoas queriam falar do futebol, do filme, da festa ou do negócio.

 

Aí ele olhava e dizia assim, estou atrasado, esqueci que eu tinha um filho e saía fora, porque ele não queria aquele assunto.

 

Então ontem a grande alegria que todos nós tivemos, ficamos lá das sete à meia-noite, foi falar do caminho, porque o caminho fica na gente.

 

E isso eu vi nos grandes empresários, já vi com tanta gente nesses 24 anos que eu sou peregrina, eu já conheci gente do mundo inteiro, é incrível a diferença.

 

Em 2016, andei alguns dias com um rapaz alemão, gordinho, gordinho, obeso, obeso, obeso mesmo.

 

E a gente começou a andar em Burgos, encontramos um jantar, amanhã posso caminhar com você.

 

Andamos uns 10, 12 dias juntos.

 

Ele só falava inglês e com muita dificuldade, tinha hora que ele pedia para parar, porque ele estava muito pesado, muito pesado mesmo.

 

A mochila ele foi conseguindo largar coisas, mas o corpo dele era muito gordo, muito difícil.

 

Só que eu estava esperando uma sobrinha minha, que é do Brasil, para chegar comigo a Santiago, ela ia me antoar só para os últimos cinco dias, e ele queria chegar logo, porque os pais iam esperar ele lá.

 

A gente marcou um jantar de despedida, só eu e ele.

 

A gente foi jantar, depois de um dia de caminhada, um dia normal, só que a gente resolveu que era o último jantar, porque ele ia dormir no lugar dele, eu ia para o albergue, ele ia para o albergue dele, enfim, depois a gente não sabia, porque ele morava, ele mora italiano, não, alemão, mora em Nuremberg.

 

Bom, aí vou jantar com o Mateo, que era de origem italiana, conversando, conversando, ele disse assim, está muito calor aqui, tirou o casaco, quando ele tirou o casaco, ele estava com um Rolex desse tamanho, azul, cheio de brilhantes.

 

No caminho?

 

Eu não tinha nem visto, e nem ele me parecia alguém que pudesse ter um relógio daquele.

 

Depois que ele é meu amigo até agora, ele já veio a Portugal me ver, veio na casa da Roberta comigo, o tamanho que ele é, ele é gigante, ele é gigante, ele produz azeite, azeitona e alcachofra na Sicília e importa para a Alemanha.

 

É como a praia no Rio de Janeiro, que fica todo mundo meio igual, você não sabe quem é, está todo mundo com aquela roupinha, não tem...

 

O caminho, ele equaliza as diferenças.

 

Dentre as diversas rotas do caminho, qual delas você acredita que oferece a experiência mais enriquecedora, considerando não apenas a distância, mas também os aspectos culturais e históricos do próprio caminho que estão envolvidos?

 

Olha, cada rota tem as suas singularidades.

 

O caminho do Norte, por exemplo, que é belíssimo, ele vem por Bilbao, Santander, Asturias, São Sebastião e tal, e vai descendo até La Corunha.

 

Você anda pelas falésias e pelas praias lá embaixo, é lindo de morrer, mas é um caminho, para mim, é caminho para cabrito, porque você vai de zero a mil num dia.

 

Eu não vou para lá, porque eu subo reclamando, eu não gosto de subir.

 

Então, eu subo, ando de macharré, faço zigue-zague, fico sentada numa pedra, descanso, depois vou de novo.

 

Eu não gosto de subir, então, para lá não vou.

 

Mas o caminho, que tem, obviamente, o caminho francês, que é o caminho mais antigo, ele é um caminho que tem mais história, porque as cidades foram se formando à medida que a colonização cristã ia chegando.

 

Então, lá no início, lá nos primórdios, quem ia para o caminho eram os camelôs da época, os mascates da época.

 

Porque peregrino é preciso de quê?

 

De água, tinha alguém vendendo água.

 

Peregrino perde sapato, tem que ter sapato para vender.

 

Isso era primeiro.

 

Depois, os padres de colonização, quando o cristianismo saiu, acabou a perseguição e começaram a vir, a primeira coisa que aparece é uma igreja.

 

E as cidades foram se formando ao lado, à volta dessas igrejas.

 

Aparecem os castelos, aparecem os templários, aparecem as disputas de território.

 

E isso, o caminho francês, é o que vai ter mais monumentos, mais história física concreta de você visitar e conseguir entender a passagem da peregrinação ao longo dos séculos.

 

O túmulo de Santiago foi descoberto no ano de 890 e só em 1200 e qualquer coisa que as pessoas começaram a caminhar para lá.

 

Afonso II foi o primeiro rei que caminhou com a sua corte a Santiago, para honrar.

 

E depois, Marcos, outros papas, as coisas foram se construindo ao longo dos séculos.

 

O caminho espanhol tem muita história, a Espanha é um país de muita história, Portugal é um país de muita história.

 

Uma coisa que adoro aqui, por exemplo, é que você pega um táxi e você elogia um prédio e um negócio, pergunta o que é aquilo ali.

 

A maioria dos motoristas portugueses tem o que contar daquilo ali.

 

Não, isso aqui foi do ano não sei quanto, do ano 5º, do ano 4º...

 

Eles têm orgulho de saber da história.

 

E a Espanha oferece essa multiplicidade cultural, seja na gastronomia, seja nas vinícolas, que são riquíssimas, são vastas.

 

A gente caminhando passa pelas vinícolas, você começa a observar que cada vinícola tem um tipo de solo.

 

Alguns são mais...

 

Aparecem só as folhas muito secas, outros aparecem com pedregulhos.

 

É um tipo de uva que precisa da folha seca para ficar mais...

 

O outro é a pedra que precisa...

 

Então, você tem tanta informação.

 

Eu acredito que o caminho francês seja o que tem mais histórias dentro da Espanha.

 

E no português é com certeza o caminho central.

 

O caminho central que pode ser feito desde Sagres, se você quiser, desde Faro, são 650 subindo para Compostela.

 

A grande maioria das pessoas, inclusive um desses amigos que estava ontem no encontro, já saiu de Lisboa e diz que a saída de Lisboa é árida porque tem muita fábrica, tem um componente poluente muito grande, é muito asfalto, você tem que andar porque não tem onde descansar.

 

Então, as pessoas preferem sair do porto, que são 240 mais ou menos.

 

Mas, com a experiência que tenho, há quem diga que não, mas, para mim, a chegada a Compostela, para quem vai para Portugal, é mais desafiante do que quem vai pela Espanha, porque tem quatro subidas muito pesadas, pedra sobre pedra, muito pesada.

 

Do lado, já é Espanha, mas veio pelo caminho de Portugal.

 

E já no caminho espanhol, você tem a Galícia, que é tudo mais para baixo, é tudo mais fresco, é tudo mais verde.

 

E agora, em abril, eu tive a alegria de conseguir levar meus três filhos para Portugal.

 

E, quando o Rodolfo me desafiou, eu disse, mas, você quer andar na Espanha ou em Portugal?

 

Eu prefiro andar na Espanha, que é o caminho que você vai mais e tal.

 

Está bem.

 

Eles estavam curiosos de saber o que é isso, que a mãe quer voltar a cada ano, deve ter alguma coisa esquisita.

 

Ou ela, mãe, é muito esquisita, ou o caminho é esquisito.

 

Ele disse que ele andou.

 

E aí, eu esperei passar um pouquinho e perguntei para ele, você quer ficar sozinho comigo ou eu posso convidar seus irmãos?

 

Não, pode convidar os irmãos também.

 

O Júnior, o mais velho, tinha vindo comigo em 2010 e sempre quis voltar.

 

E a Roberta, achei que ela ia dizer, deixa fora dessa, está bom assim, entendeu?

 

Mas, não, topou.

 

E acho que ela ficou mais interessada em estar comigo e os irmãos do que exatamente pelo caminho, entendeu?

 

E foi genial, porque eu me dei conta que nós quatro nunca tínhamos ficado sozinhos, só nós quatro.

 

Tinha sempre um marido, uma babá, um amiguinho, um avô, enfim, nós quatro sozinhos não.

 

E o que ficou muito claro no caminho, e que se a gente comentava isso um pouquinho todo dia, é de que nem parece, eu tenho filhos adultos, todo mundo casado, cada um com a sua família, nem parece que a gente já não mora junto há tantos anos.

 

O caminho faz essas descobertas também, mostra para a gente o que é possível.

 

E eles adoraram, porque é muita informação, é história pura, você está pisando uma senda de milhares.

 

Então, vai dizer, mas o que acontece lá?

 

Claro que está formada uma igregora lá, claro, não tem outra coisa, aquilo anda embaixo da Via Láctea, quando você anda à noite, você anda sempre para oeste e você está embaixo das estrelas, que é a máxima lá do início, lá do primeiro pastoreiro que descobriu o túnel de Santiago, onde ele, quer dizer, tudo tem história e tem lenda.

 

Então, dizia-se que o santo homem tinha sido decapitado em Jerusalém e que os seus discípulos tinham que salvar aquela situação.

 

Então, um grupo pegou a cabeça e um grupo pegou o corpo, naquela altura não haviam caixões de madeira, era pedra mesmo, puseram a pedra dentro de uma barca, e um grupo com a cabeça foi pelas rias de abaixo, que é hoje o caminho espiritual, que se faz de barco, entra pelos rios da Galícia, embaixo, até Padrón, e de Padrón você caminha de novo a Santiago.

 

Então, reza a lenda que embaixo da igreja, do altar da igreja de Padrón, está a cabeça de Santiago, como reza a lenda que embaixo da catedral está o túmulo de Santiago.

 

E, quando esse túmulo foi descoberto, a história diz que foi um rei que mandou um emissário procurar, porque tinha essa história de que Santiago estaria enterrado na Galícia, porque naquela altura se enterrava as pessoas aonde haviam trabalhado e, supostamente, ele tinha saído de Jerusalém, tinha conseguido chegar à Galícia.

 

E toda a história tem uma lenda, e é a lenda do pastorinho, que não é o emissário do túmulo, é um pastor que pastorava suas ovelhas e que viu um monte de estrelas caminhando no céu, e ele não tinha nada para fazer mesmo, estava seguindo as ovelhas, resolveu seguir as estrelas, e, quando as estrelas, quando ele encontrou as estrelas, elas estavam depositadas no chão.

 

E ele, quando encontrou as estrelas, ele encontrou também o túmulo de Santiago, num campo de estrela.

 

Então, Campos Estrelares, Campos de Estrela Compostela.

 

Ele disse que a gente não diz que vai a Santiago, a gente vai a Compostela, que é o Santiago, que, aliás, é o São James, São Jacob, São Francis, é tudo o mesmo santo, só mudou a língua.

 

É São Jacques, São Jacob, São James, é tudo São Jacques, só mudou o idioma.

 

E a lenda da concha, a gente já falou da concha antes, eu não falei da lenda.

 

A lenda diz que o peregrino carrega a sua concha ao longo do caminho para ir preenchendo, ela é assim, côncava.

 

Então, para ir preenchendo a concha com as suas experiências no caminho, para, ao chegar a Santiago, a Compostela, poder oferecer ao santo o que você tem de melhor que a sua pérola.

 

Não é bonitinho?

 

Interessante.

 

É linda a história, é linda.

 

E ao chegar em Santiago, qual elemento, seja uma prática, um símbolo, uma própria experiência específica, você considera que significativo para os peregrinos e por quê?

 

Olha, o grande momento do peregrino chegando a Compostela é a Praça do Obradoiro.

 

A Praça do Obradoiro é o primeiro lugar onde você vê a catedral.

 

Ali, que, aliás, é um dos grandes programas também, você tá sentado ali, encostado e a praça é muito grande.

 

De um lado tem a catedral, na frente tem a sede do governo, do lado tem a primeira universidade, a primeira sede da Universidade de Santiago, e do outro lado tem o Parador Três Reis, que é um hotel hoje seis estrelas, mas que foi construído para ser presídio, porque quem peregrinava era presidiário.

 

Depois ele foi hospício, porque as pessoas chegavam também relacionadas, virou hospital e hoje é um hotel seis estrelas.

 

Então, ali, nessa praça, quando a gente já chegou, já fez tudo o que tinha que fazer, no dia seguinte, você fica lá sentado, vê a expressão das pessoas que chegam, a reação de cada pessoa, de cada grupo.

 

Tem uns que chegam, se jogam no chão e gritam, o outro pega o telefone, liga, o outro olha para o céu e agradece, o outro senta e se abraça, o outro chora.

 

É um lugar mágico se você ficar parado olhando as pessoas, mas é o primeiro impacto da chegada.

 

Quem é muito religioso, para esse muito religioso, falta fazer o caminho para abraçar o santo.

 

E mesmo quem não é tão religioso acaba fazendo esse ritual.

 

Lá no início, quando eu comecei, a gente podia botar a mão numa coluna, no Pórtico da Glória, hoje não pode mais, está lá, as pessoas não tocam, as pessoas empurram.

 

Acho que aquilo é pedra que não vai cair.

 

Está fazendo buraco.

 

Hoje tem os buracos, cinco dedos aparecendo assim na coluna, então eles pararam de botar.

 

Ali você botava a mão, depois tem uma imagem de Santiago embaixo, você batia a cabeça para o santo, ajoelhava, dava a volta, fazia um círculo em volta dessa coluna e aí você ia visitar o túmulo, e aí você ia passar para abraçar o santo lá em cima, que é um busto de Santiago em ouro e pedras religiosas, que está no altar, mas na penúltima etapa do altar, digamos assim, e é uma imagem grande onde você abraça ele por trás e nas costas, é como se fosse só o tronco, só o busto dele, então o busto e a cabeça.

 

O busto está revestido de uma roupa com pedras e atrás, nas costas, na concha, então você abraça ele de trás para frente e encosta sua cabeça na concha, é uma reverência, um agradecimento, uma gratidão.

 

E ali termina o seu ritual de chegada.

 

Dali você vai para uma oficina do peregrino com a sua credencial, onde é um pedaço de papel que você tem que mostrar, ou melhor, tem que carimbar onde você dorme, para chegar em Santiago a oficina do peregrino e saber quanto você andou, porque se você dorme no porto e amanhece em Lisboa, não andou, são 300 quilômetros, então hoje em dia eles já pedem, tem muitos perto, não é isso, né?

 

Tem muitos perto, então ele hoje pede dois carimbos no lugar que você dorme, então você carimba quando chega e carimba quando sai, para chegar lá e você ter o direito a um diploma em latim com seu nome, onde diz que você caminhou 100 quilômetros a Santiago ou 200 quilômetros de bicicleta.

 

E já está tendo, então, um movimento dentro da diretoria do Tchacovéu, Tchacovéu é o núcleo religioso de Compostela, para mudar isso para 200 quilômetros a pé e 300 de bicicleta, porque esses últimos 100 quilômetros, Maurício, estão assim excessivamente povoados, a maioria das pessoas vai para fazer esse 100% para ter o diploma, então é o momento que é mais difícil para quem está no caminho há mais tempo, mesmo que tenha só menos uma semana, porque o que acontece é que você já vem no caminho cansado, já vem andando há muitos dias e você pega pessoas que saíam ontem de casa e vão tomando o lugar, vão com uma alegria que não atrapalha a alegria, mas é um ruído que o peregrino não quer mais, ele já está em outro mood, em outro flow, em outra maneira, e os albergues não tem lugar, está poluído, esses últimos 15 quilômetros estão muito difíceis, é melhor fazer numa época menos indicada, digamos assim, porque a melhor época é entre junho e setembro, porque o verão na Espanha é entre 46 e 47 graus, eu já fiz essa bobagem duas vezes lá atrás, não faço mais.

 

É muito desconfortável.

 

Não, é um risco para saúde e ao mesmo tempo é um esforço louco, eu não me desfaço da mochila, porque eu acredito que eu posturo maior quando estou com peso, sem peso a tendência é você ceder mais o corpo.

 

Esse ano, por exemplo, eu fui com meus filhos, fui em abril, quando eu vim com o Júnior em 2010, a gente saiu em final de março, frio, frio, e como o planeta está mudando muito, as estações não estão tão mais reconhecidas como sempre foram, quando eu comecei a sair da França, cheguei na França, na fronteira para começar a fazer o caminho todo em 2016, era primeiro de maio, estava nevando.

 

Lá em cima, em Sanjã e Roças Vales estava nevando, então não dá mais para saber, a gente fala que é maio e junho, que é primavera, e setembro que está acabando o verão, a Europa volta para as aulas, volta para o ano, e são as férias.

 

Fica melhor, fica menos difícil, menos poluído de gente, mas em compensação outubro começa a chover na Espanha, dia primeiro você pode abrir a capa porque vai chover e também andar com chuva é muito enjoado.

 

Eu já estive na Universidade de Santiago duas vezes para estudar, duas vezes em outubro e as duas vezes com chuva o tempo todo.

 

Não é o melhor momento.

 

O ano passado, quando eu saí de Salamanca a pé, quando a gente chegou para subir as ladeiras de Portugal, chuva, chuva, chuva, água no pé, água no pé direto.

 

É mais desafiante, né?

 

Então é de novo, não dá para saber o tempo que você vai levar para subir, não interessa, o que interessa é que você tuba sem prejudicar, porque também se cair ali não chega nem moto para te pegar, né?

 

Na chuva não são subidas que você deve fazer sozinho, pelo menos alguém do lado, né?

 

Então você vai respeitando o caminho, você vai aprendendo o que deve, o que não deve, o que vai te ajudar, o que não vai prejudicar ninguém.

 

Nós chegamos agora no pinga-fogo, são três perguntas rápidas que eu faço a todos os convidados.

 

A primeira delas, quais são as virtudes do empreendedor de sucesso?

 

Para mim a principal é a humildade, o olhar para o seu próximo, a obediência, acho que a palavra é obediência, mas eu vou falar isso, a saúde holística da sua própria empresa, ele precisa ter certeza de conhecer os seus funcionários, de conhecer a história de cada um, de que todos estejam bem, de que todos sejam felizes trabalhando ali com ele.

 

Não está feliz?

 

Ok, ajuda a encontrar o caminho melhor.

 

Então eu acho que na humildade ele olha para o outro, na humildade ele se preocupa com o seu funcionário.

 

Eu acho que hoje é a qualidade mais forte que eu vejo no empreendedor de poder olhar para o seu próximo e sem humildade não consegue olhar.

 

O que diferencia os sonhadores dos fazedores?

 

Eu acho que os fazedores são mais corajosos do que sonhadores, eu acho, eu não gosto da palavra eu acho não, eu acredito, porque o sonho é fundamental, o sonho te alerta, te dá um propósito, mas também só ficar na rede sonhando não realiza.

 

Então eu acho que quem faz, acredito que quem faz sonhou antes, mas eu acho que não são exatamente duas categorias, não vai entrar para o pessoal dos operadores e dos gestores ou da logística ou do planejamento, aí não, de uma forma simples é assim.

 

Eu acho que quem realmente realiza é mais corajoso do que o sonho, do que quem sonha.

 

E a última, o que é design?

 

Para mim design é propósito, propósito no sentido da idealização do sonho ou de como realizar um propósito e o design é tão amplo, porque é uma palavra moderna, mas você tem o design thinking, você tem o design na decoração, na arquitetura, no financiamento, como é que você faz suas planilhas, como é que você se organiza, se não organiza, como é que você desenha aquele projeto, como é que você desenha a sobrevivência da sua empresa financeiramente.

 

Eu acho que design é uma palavra muito ampla hoje, mas acredito que a primeira que me ocorre, como isso aqui é um pinga-fogo, eu acho que o design é isso, é o propósito, o que eu quero fazer.

 

Já isso que eu quero fazer, eu tenho que desenhar isso, eu tenho que criar isso, eu tenho que dar forma a essa ideia.

 

Eu acho que o design dá forma às ideias.

 

Excelente.

 

Muito bem, nós chegamos agora numa das sessões bastante apreciadas do Paul Brandt, que é a indicação de leituras.

 

Quais leituras impactaram a tua trajetória?

 

Bom, é quase óbvio, mas o primeiro foi quando começou o meu caminho espiritual, que foi a autobiografia de um iogue do Yogananda.

 

Eu acho que é um livro verdadeiro para todo mundo e eu dediquei esse livro uma vez a uma pessoa, onde eu disse assim, esse livro vai poder agir em você como um verdadeiro oceano, dependerá da sua postura de pedra ou areia.

 

Se a pessoa é pedra, não entra.

 

Se a pessoa é areia, absorve, flui.

 

Então esse foi o primeiro.

 

O segundo foi o Diário do Mago, do Paulo, que me mostrou que existia um lugar no mundo onde as pessoas vão para se conhecer, que não é um spa, que não é um hotel, que não é um acampamento, que é possível você estar andando naquele lugar, em segurança e em busca.

 

Então foi isso que me tocou.

 

Eu não achei que eu ia para o caminho para ver a Virgem Maria, nem que brigar com o cachorro que ele encontrou, mas eu levei 10 anos para conseguir pisar no caminho a primeira vez.

 

Então foi o Diário do Mago e o Alquimista, que mostrou toda a beleza do sonho e da crença.

 

É uma crença na humanidade, é uma crença na tua possibilidade pessoal.

 

Então ele realmente me tocou muito.

 

E um livro que é pequenininho, mas que eu amo de paixão, é o Água Viva, da Clarice Lispector, onde ela diz uma frase que ficou na minha cabeça, que ela diz, um instante já é.

 

E quando eu penso para falar com você, já passou.

 

Ele é pequenininho, ele é fininho mesmo e eu não vou nem abrir, porque eu era capaz de ficar feio, mas ele está todo rabiscado.

 

Eu faço o mesmo com os meus livros.

 

Eu não sei, mesmo que eu não volte lá, mas eu rabisco.

 

E aqui atrás de mim tem um tapete na parede, eu vou sair aqui um pouquinho, não sei se dá para ver, que diz, falo nem ontem, nem amanhã, mas hoje e neste próprio instante perecível.

 

Clarice Lispector, que é uma deusa na minha vida, que eu adoro ela.

 

Então, em recomendação, se é isso o propósito, são dois livros que me levaram para o caminho, dois livros que fazem a gente sonhar, dois livros que mostram uma experiência pessoal, que não é igual para ninguém, mas que estimula, que encanta, que é bom de ler.

 

O Yogananda mostra todo um caminho espiritual e toda a necessidade do silêncio interno, que não é nada fácil, não é nada fácil.

 

Eu, então, que penso muito para ficar em silêncio, para não me isolar.

 

E é Clarice que tem essa sabedoria da vida, do dia a dia, ao mesmo tempo, esse debatimento pessoal, apesar de ela parecer uma pessoa muito triste, mas era muito atenta, e que diz coisas fantásticas, e que faz a gente lembrar que a vida é agora, a vida é enquanto a gente vive, não é aquela do planejamento, não é uma que vai chegar mês que vem, e que você não sabe nada.

 

Eu acho que o nosso caminhar do dia a dia é muito parecido com o do caminho, sabe, Maurício?

 

No caminho você segue a seta amarela, sabe que tem que seguir a seta para poder chegar, e se não seguir a seta, não chega onde você quer, mas você não sabe o que vem à frente, você não sabe se daqui a meia hora você está pisando na lama, se vai pisar na areia, se vai chover, se não vai chover, se onde você vai chegar tem comida, não tem, se tem banco, se não tem, se você consegue dormir, se não consegue.

 

E a vida é assim, a gente tem a presunção do saber, a gente acha que no Natal vai estar, não sei aonde, você acha que vai passar o Réveillon, não sei aonde, ok, maybe yes, maybe not.

 

E não é só o caminho que é incerto, o nosso passo dado, nós já não somos mais os mesmos do caminho anterior.

 

Claro, claro, a analogia que eu faço do caminho com a vida é isso, a gente está conversando, você tem seus planos para hoje à noite, para amanhã, para depois, mas a gente não sabe, não precisa muita coisa, basta bater com a cabeça errado, não chega a acertar.

 

Então eu acho que é isso, eu acho que é essa coisa do momento, do agora, da gratidão de você se perceber no agora, na gratidão de você se perceber ativa, consciente, atenta, interessada, é muito chata a pessoa que não tem interesse, a pessoa que não é curiosa, acha que sabe tudo, já vi, não, já fui, eu sou igual criança, eu sou curiosa demais, então eu não sou curiosa nos outros, tenho o menor interesse na vida de ninguém, mas sou curiosa da vida, então no caminho eu não faço tempo para nada, eu escuto o rio cantar, eu escuto o passarinho, eu estou com sono, deito em bar da árvore, eu dormi, eu fotografo o meu livro, é tudo feito com meu telemóvel, tudo feito com telefone, e às vezes é o simples, às vezes é uma coisa encantadora, mas é o estar aqui agora, é você se perceber viva, isso é que eu acho que faz toda a diferença, porque senão você está vivendo sem existir, e aí é muito ingrato com quem permitiu a gente chegar aqui, então acho que tem que, é aí que as pessoas envelhecem, é aí que as pessoas perdem o interesse, o envelhecimento não está no corpo, está também, mas não faz diferença se você tiver alguns mínimos cuidados, você leva bem, a coisa é aqui, a caixa preta é que dá defeito, a caixa preta é que atrapalha, na hora que você acha que sabe ou não quer saber mais nada, aí a vida fica muito sem graça, muito sem propósito.

 

Riquíssima lista de recomendações, e para facilitar o acesso de todos que nos assistem, nós disponibilizamos os links destes livros diretamente na descrição, além disso eu convido todos a explorar a nossa sessão livro no site podbrand.design, onde nós reunimos uma curadoria com mais de 250 livros recomendados por todos os nossos convidados, e estes que a Maria Alice nos indica agora, inclusive o de sua autoria.

 

Maria Alice, eu tenho ainda a pergunta original que eu trago da Fernanda Bizarria, ela é fundadora da PS2P, que é um observatório de comportamento e cultura, e que esteve recentemente no podbrand, e ela formulou esta questão sem ter ideia de que seria você a nossa próxima convidada.

 

Considerando o ano difícil que estamos tendo, com guerras e variações climáticas em vários lugares do mundo, com conflitos étnicos e de toda a natureza, o que falta para a humanidade para despertar e que se una para o desenho de um mundo mais justo, mais gentil e em harmonia com a natureza?

 

Eu tô me repetindo, mas eu vou pedir desculpa a Fernanda, vou usar a palavra de novo, eu acho de novo que é humildade, eu acho que, não gosto dessa palavra, eu acredito que sem ser piegas, sem denegrir qualquer possibilidade individual, qualquer vida que cada um tenha, qualquer mérito de estar onde alcançou, não é isso, é o olhar para o outro, é o olhar para o seu semelhante como se fosse você mesma, é perceber a dor do outro, que é a sua dor, é perceber a sua dificuldade, olhando que tanta gente tem a mesma e tanta gente tem mais ainda.

 

Então acho que nesse mundo de guerras, nesse mundo de conflitos políticos, porque a gente vê que temos aí uma guerra absolutamente estúpida, que é por uma liderança de território, tem uma outra guerra mais estúpida que é por ódio, isso não leva a nada, porque são os nossos filhos, os nossos pais, os nossos amigos que estão morrendo lá, e as pessoas não comem, choram, têm dores, se ferem, como nós.

 

Só que é cômodo, a gente está longe daquilo, então eu acho que na hora em que cada um de nós, cada pessoa se conscientiza do seu papel como cidadão neste mundo de agora, nesse agora, hoje, onde você seleta o seu lixo, onde você não gasta o que você precisa, onde você compartilha o que você não precisa, quando você olha para o seu semelhante e busca se ele está bem, se ele não está bem, o que você pode fazer por ele.

 

Eu acho que é assim que o mundo pode mudar, é assim que a gente pode, com todas as diferenças, as desigualdades, a pluralidade, a diferença de crenças que atrapalham tanto e crenças invisíveis, eu acho que essas são as mais difíceis, porque você não consegue entender como é que a pessoa, como é que ela, que não constrói, que só destrói ou que não leva a nada, que não...

 

Enfim, então eu acredito nisso, acho que a palavra humildade leva a gente para um lugar de semelhança com o seu próximo, leva a gente para um lugar onde você não exatamente se diminui, mas você se iguala e no que você se iguala você consegue perceber, sentir melhor dizendo, interagir, reagir, percebendo no outro aquilo que é seu.

 

E eu acho que é a única maneira, porque eu não vejo as pessoas ricas mais felizes, eu não vejo as pessoas com poder, nem mais felizes, nem podendo fazer o que deveriam fazer para um mundo mais igualitário, também não vejo as pessoas de muito poder e muito dinheiro saber onde é que fica o lixo da sua casa, também não vejo as pessoas de muito poder e às vezes muito dinheiro saber como é que vive o seu secretário na casa, quem ainda tem isso, na Europa é mais fácil não ter.

 

E eu acho que é aí que faz a diferença, é quando você deixa de ser uma ilha, tem que se afastar da ilha para poder ver a ilha, se você não sai dela, ela é quase um continente inteiro, tem que se afastar dela para poder ver a ilha.

 

E se não fizer isso, eu acho que é muito ruim, porque eu não sou uma pessoa negativa, não penso que é ruim, eu não vejo filme de tiros e facadas, não vejo notícia ruim, me preservo de toda essa, toda energia pesada que eu posso, pessoas pesadas, aqui não entra, não tem nada, mas a tecnologia leva para isso, a velocidade da comunicação, a globalização, a interação, segundos as coisas, você fica sabendo o que aconteceu lá na Groenlândia, você sabe o que aconteceu, e isso é muito rápido para a velocidade do nosso pensamento que nem é tão rápido, agora não acompanha mais, e o que você pode fazer também não anda nessa mesma velocidade, a não ser que eu queira pular pela janela, mas eu pulando pela janela só vou morrer mais depressa, não vou conseguir ajudar ninguém.

 

Então eu acho que a palavra é essa, é de igualitário, uma coisa humana, mais humana, mais atenta ao outro, acho que faz toda a diferença, eu acho que tem que ser o caminho, acho que é a hora.

 

E se você pudesse fazer uma única pergunta ao nosso próximo convidado, qual seria?

 

Por que você aceitou conversar com Maurício no Podbrand?

 

Interessante, eu faria essa pergunta, vai ser o nosso primeiro episódio de 2024.

 

Eu posso responder, mas a pergunta não é para mim, então quando a pessoa responder eu vou querer saber.

 

Muito bem, excelente Maurício, que encontro maravilhoso ter você hoje no Podbrand, aqui comigo, e por se engajar no nosso propósito.

 

Muito obrigado por fazer a diferença e compartilhar conosco essa experiência tão enriquecedora, tão bonita, tão inspiradora.

 

Muito obrigado de coração.

 

Obrigada a você, Maurício, por o convite, a gente pode conversar sobre outros aspectos depois, num outro Podbrand adiante, eu sou embaixadora de diversos segmentos aqui em Portugal, as pessoas podem me contactar pelo meu Instagram e pelo do livro também, pelo LinkedIn.

 

O meu propósito de vida é ser útil, então você trabalha?

 

Não, não trabalho mais, mas em compensação não tem tempo para nada, porque eu trabalho o tempo todo, então quantas vezes você precisar de mim, para o que precisar, qualquer pessoa que esteja nos ouvindo, qualquer contato, sejam bem-vindos, podem chegar, podem chegar, estou sempre aberta a conversa, a conhecer gente, e estou feliz de estar aqui com você, conversa fácil, então falar do caminho é quase que um vício, então muito grata, obrigado ao nosso amigo Harry que nos apresentou, e que a gente possa estar de verdade, de verdade mesmo se unindo para que as pessoas, não digo aprender não, mas que se unam, que cada experiência de cada entrevistador seu seja mais um pontinho de aprendizado, mais um degrau de sabedoria, mais um porquê das pessoas estarem juntas, enfim, que tenham todos um ano lindo, que seja um ano mais fácil para todo mundo, que o mundo seja menos agressivo e que todos nós tenhamos um bom caminho, sempre.

 

Amém.

 

As mídias sociais da Maria Alice estão aí abaixo na descrição também.

 

Feliz ano novo e foi uma honra te ter neste último episódio de 2023 com a gente, Maria Alice.

 

Amém, feliz 2024, com muita luz, com muita saúde e um bom caminho sempre.

 

Obrigado.

 

Até breve.

 

Tchau.

 

À medida que encerramos este episódio inspirador do Podbrand, fica mais evidente a importância da jornada da Maria Alice Medina para qualquer empreendedor, para qualquer pessoa, a experiência de vida que ela compartilhou conosco, transitando do dinamismo do Rock in Rio, as reflexivas trilhas da Virgem de Santiago.

 

Isso nos ensina sobre a importância da resiliência, reinvenção e da busca por um equilíbrio entre a mente e o espírito.

 

Sua história é um lembrete poderoso para que, neste novo ano, a gente construa um mundo melhor para todos, importante para qualquer pessoa e que o processo não seja somente estéril, mas, sobretudo, de introspecção e de autoconhecimento.

 

Eu convido a todos a visitarem o site do podbrand.design e, se puderem, fazer um favor a nós e alguém que você conhece, compartilhando este belo episódio de encerramento de 2023.

 

Nos vemos em 2024, aqui no Podbrand, o podcast do Design.

Aviso Legal: Por favor, note que a descrição deste episódio do Podbrand foi gerada por Inteligência Artificial (IA). Apesar de nossos esforços para garantir precisão e relevância, pode haver ocasionalmente pequenos erros ou discrepâncias no conteúdo. 

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